Não venhas assim, numa de faz de conta. Não penses que chegas e me arrebatas. Os tempos mudaram. Não sou mais "a camisa branca sensual". Hoje, sou a Mulher. Que domina. Que te resiste. Que te seduz. Que te fecha a porta na cara. Que te demonstra que sem ti também respira. Que caminha. Que não se trata apenas de sobreviver, mas viver a vida. Mais do que quando era a tua. Percebe que hoje, viver sem ti é mais fácil do que viver para que estejas presente. Já não preciso de ti, aqui, para sorrir. Preciso apenas de mim. Hoje, sei o sabor da liberdade. Por não te ter e por não te querer mais. Podes voltar, podes ir. Quando quiseres, quando bem te apetecer. Vou estar aqui de qualquer maneira, mas não serei eu a dar-te o resto da vida. Nem tão pouco o mundo. Mudei de rumo. Dar-te-ei o instante, se tivermos essa necessidade. Atos do momento. Nada mais do que isso. Nada mais.
Ai esse olhar que me deixa à toa. Essa distância que me transforma em contador de quilómetros. Como se a cada passo que dou me sentisse mais perto de ti. Não quero ser a ausência que desapega. Quero a distância que fortalece. Que aproxima. Que mesmo não estando "aqui e agora", está presente. Sempre. Por cada caminho que traço, quero voltar. Voltar ao meu porto de abrigo. Ao lugar que é só meu. Ao carinho. Ao aconchego. A tudo o que não quero que deixe de ser meu. Só meu. Egoísmos à parte, quero que o tempo voe, sempre que eu não estiver. E que trave quando eu chegar. Quero ser a vontade em cada regresso. Quero o melhor de cada momento.
Não sei o que te escreva, nem tão pouco sei o que te quero dizer. Ou talvez saiba?! - Estranho, a nossa mente confunde-nos tanto. Queria-te amar, mas já não tenho forças para isso. Queria ter saudades tuas, mas já não sinto essa necessidade. Guardo cada despedida na estação, bem no coração. Guardo o olhar intenso e resistente às lágrimas pelo vidro do comboio. Sigo-te até não te ver mais, até o teu sorriso ser apenas imagens da memória. Eu amei-te. Nesses regressos e partidas, eu contava os segundos que faltavam para a próxima vez. Não te queria perder. Em cada abraço de "adeus", arrancavas um pedaço de mim. Nunca foste embora sozinho. Deixei que me levasses, sem que te apercebesses. Tu não me vias, tu não me sentias, mas eu estava onde tu quisesses que eu estivesse. Não sabia de todos os teus passos, mas confiava no teu percurso, estava segura de ti. E de nós. Desde o primeiro dia, ainda sem o ser, já o era. Já o era nos olhares, nos sorrisos, nas mensagens sem motivo, mas que tatuavam um frio na barriga por sentir o telemóvel vibrar, por saber de quem era, por saber que as palavras não definiam tudo, mas havia tanto nas linhas que nos uniam. Inexplicável. Já o era na vontade de estar lado a lado, sem que o admitíssemos, na cumplicidade de um simples jogo de cartas ou, nos sussuros inquietos. Já o era nas brincadeiras desajeitadas, na timidez irreverente e na oposição de ideias. Uma força desmedidca apoderou-se de nós. E nós deixámo-nos levar. Foi bom, foi maravilhoso. Não há arrependimento, há algo miraculante que reservo no meu coração. Com um toque de um "para sempre" que falhou, mas de uma eternidade incessante. Sabem aquela sensação de que algo pode ser vosso para sempre? Pode não ser concreto, mas eu acredito que há coisas que levamos connosco para a vida. E tu és mais do que isso, és ainda, hoje, uma parte fundamental na minha existência. Marcaste-me como uma tatuagem, daquelas que não nos arrependemos de fazer e nos dá vontade de fazer mais e mais. Mas controlo-me. Quantidade, não seria qualidade. Prefiro prender-me ao passado, e recordar-nos sob a forma de um verão que não passou. Estou aqui, com a certeza de que já não te quero, como te quis e também, já não te tenho como te tive. Tenho-te de outra maneira, temo-nos de uma forma só nossa. E deixemos a nossa fórmula inabalável... como uma porta férrea que o comboio não derruba, esse mesmo que apanhaste e não tem saída, porque tu estás em mim, para sempre. E eu sei que de uma forma só tua, e acredito que especial, também estarei para sempre em ti. Temo-nos de uma forma bela. Só nossa. Por isso, o segredo está guardado a sete chaves.
- Vamos passear? Temos um cadeado para proteger, uma chave para atirar ao rio. - Talvez seja melhor dividi-la ao meio, não para que a nossa relação seja quebrada, mas para que em margens opostas nos possamos recordar um ao outro.